Friday, June 09, 2006

&ETC...



Em 1978, era editada uma obra-prima de Herberto Helder, O CORPO O LUXO A OBRA , com um desenho de Carlos Ferreiro, como já era costume.
A palavra "puxava" a imagem e, vendo bem, não podia haver melhor título: do corpo (que eu entendo como corpo da palavra) nasce o luxo ( o espaço ) da obra; num processo muito semelhante ao dos alquimistas: da pedra ( que como a palavra é substancia ) nasce o espaço ( o brilho ) do ouro.
Herberto Helder abre o livro com uma citação de HÚMUS, de 1966/7 :

"A pedra abre a cauda de ouro incessante,
somos palavras,
peixes repercutidos.
Só a água fala nos buracos.
(...)
Sou os mortos- diz uma árvore
com a flor recalcada.
E assim as árvores
chegam ao céu."

E já no interior misterioso do poema do corpo, do luxo e da obra:

"...
O luxo do espaço é um talento da árvore,
a arte do mundo húmido.
Por dentro da terra
o ouro cresce
em cadeia.Vi
os flancos suados das casas
contorcendo-se
no fundo
da luz,
onde o dia faz uma ressaca onde
gira a noite com seu tronco de planetas."

E termina: " Assim:
o nervo que entrelaça a carne toda,
de estrela a estrela da obra."

Foi escrito em 22-23-XI-77 e publicado um ano depois.
Deixa no fim, em citação para quem pudesse ler e entender, a transcrição da Tábua de Esmeralda, de Hermes Trismegisto.E conclui, para nós todos, leitores:
" No âmbito das funções e valores simbólicos, o poema é o corpo da transmutação, a árvore do ouro, vida transformada: a obra. O poema faz-se com o corpo, no corpo, de baixo até cima, sagitariamente.Ou num ininterrupto circuito zodiacal."

A referencia ao mistério zodiacal recorda-me o que pretendo ainda fazer : conversar no blog com outro poeta que admiro,
o Alberto Pimenta, também ele na &ETC., também ele com uma voz que é corpo transfigurado.

No comments: