Monday, September 17, 2007

Na noite de Borges

I
O jardineiro é feliz.

Cultiva o seu jardim
maior ou menor
oculto ou revelado

O jardineiro é feliz
no espaço que lhe foi
dado

II
A aurora ilude
ao prometer o dia.

Traz consigo o poente
o declinar da luz
a noite
que se esconde

Canta um pássaro
mas é finita
a sua melodia

III
Um homem sozinho na sua noite
sozinho no seu silencio
de mar
ou de montanha

Ao longe as palavras certeiras
que não são para ele

Seguem outro caminho

Wednesday, September 05, 2007

Ler Borges



I

Ler Borges
é caminhar
por sendeiros estreitos
linhas e entrelinhas
que nos atiram para
o precipício de um nome
uma obra
uma ideia
uma imagem
que nos prende e
nos cega não ilumina
perturba
tomemos as rosas
que ele dá a contemplar
e parece
que nunca murcharão
uma é rosa amarela
outra é centro do mundo
mas não do nosso olhar
que se perde
não vemos o infinito
sentimos a dôr aguda
de ler
mas não de ver
outra ainda
é rosa de alquimistas
as abelhas
em busca do seu mel
da rosa de Jean de Meung
disse Borges
que ela não existe
é como a flôr azul
de outro romântico suave
o romance da rosa é um labirinto
de disparates
apesar do sucesso que teve
noutros tempos
os seus
que não os nossos
os de Borges
os nossos tempos são outros
ainda que ele goste de se
contradizer quando fala do outro
que é o mesmo
não há mesmos
só outros
outrar-se é
o que ele faz melhor
como Pessoa
teríamos de ler a sua biblioteca
aí também se escondem rosas
as de Ricardo, o Reis, que se coroa
de rosas
porque são belas e
efémeras e
logo murcharão
lembrando o seu destino
que não concede
ao centro
nenhuma revelação

Dirão alguns
ao ler-me
e o lírio de Saron
a rosa dos vales?

e a rosa de Celan
a de má cinza?


a rosa que é
a rosa
que é
a rosa
que é a rosa?

Borges diz
"ser para sempre;mas nunca ter sido".

II

Também eu
sou os livros que li
(não os que leio
os que li )

as leituras estão feitas
a vida está vivida
nada de novo
nas páginas que folheio
nas pétalas
que desfolho
não busco a interrogação
mas o ponto final

III

O Anjo da Memória:

No pequeno caderno
inscreve o nome

qualquer letra
lhe serve

ele é o dono
do alfabeto inteiro

IV

É a memória
que (me) divide
o tempo

nele me posso
(re)ver

espelho
da água que (es)corre

o tempo define
o espaço
e eu definho
no tempo

nessa onda me afundo
não me salvo

VI

E Rilke ?

Rilke é outro que tal
deixou-se encantar pela rosa
a imagem da rosa
o perfume da rosa
a ideia de rosa
ideia
que mais tarde
o haveria de matar
com o seu espinho
bem real